NRF Paris 2025
Varejo sustentável: colaboração e inovação guiam o futuro do setor
IKEA, Kiabi e Yamamay debatem na NRF Paris os desafios e soluções para um varejo sustentável, unindo inovação, circularidade e acessibilidade.

Os consumidores estão cada vez mais atentos a práticas ecológicas e éticas, e sabendo disso, líderes do varejo se reuniram na NRF Paris para discutir como o setor pode evoluir de forma mais responsável e sustentável. O painel “Together, Creating a More Responsible and Sustainable Retail” reuniu vozes influentes que compartilharam estratégias, desafios e soluções inovadoras para transformar o varejo em uma força positiva para o planeta.
Com moderação de Charlotte Hardie, editora-chefe da Retail Week do Reino Unido, participaram do debate Francesco Pinto (Chairman da Yamamay), Camille Caron (CSR Leader da Kiabi) e Emma Recco (Business Development Manager da IKEA França).
Transformação necessária: do produto ao consumidor
Charlotte abriu a conversa destacando que a sustentabilidade deve estar presente em toda a cadeia, desde o design do produto até a sua segunda vida, incluindo logística, modelos circulares e engajamento do consumidor.
O painel destacou a necessidade de varejistas investirem em:
- Cadeias produtivas transparentes, com fornecedores éticos e condições justas de trabalho;
- Redução de desperdícios, por meio de melhor previsão de demanda e processos inteligentes;
- Economia circular, com produtos de segunda mão, aluguel, vintage e redes C2C;
- Educação do consumidor, incentivando hábitos de compra mais conscientes.
“O consumidor quer escolhas conscientes, mas também acessíveis. Nosso papel é tornar a sustentabilidade uma realidade para todos”, afirmou Charlotte.
Kiabi: circularidade como modelo de negócio
A Kiabi, presente em 33 países e com 24 milhões de clientes anuais, compartilhou sua jornada rumo a um modelo mais sustentável. Há três anos, a empresa realizou uma análise de carbono profunda e identificou que suas práticas não estavam alinhadas com as metas científicas necessárias para enfrentar a crise climática.
A partir desse diagnóstico, definiu três pilares estratégicos:
- Eco design e produção responsável: hoje, 90% das fibras naturais utilizadas são de origem sustentável.
- Circularidade: todas as lojas na França já possuem 25% de espaço dedicado a produtos de segunda mão, modelo que está sendo expandido para outros países.
- Transformação cultural: mudança interna para engajar equipes e consumidores em torno da sustentabilidade.
Além disso, a Kiabi lançou um programa de agricultura regenerativa, visando preservar o solo e garantir que o cultivo de fibras naturais seja renovável e benéfico para comunidades rurais.
“Sustentabilidade não é apenas um discurso, mas parte da nossa cultura e das escolhas diárias da empresa”, afirmou Camille Caron.
IKEA: logística verde, reciclagem e planejamento de longo prazo
Com 36 lojas, cinco centros de distribuição e 12 mil colaboradores na França, a IKEA apresentou um plano ambicioso: reduzir pela metade sua pegada de carbono até 2030 (em relação a 2016) e atingir a neutralidade em 2050.
Nos últimos anos, a empresa viu as vendas online crescerem de 10% para quase 30% do faturamento. Esse aumento trouxe novos desafios logísticos, especialmente no transporte de mercadorias. Para reduzir o uso de caminhões, a IKEA implementou alternativas inovadoras, como:
- Transporte fluvial em Paris, realizando entregas por barco;
- Uso de trens para substituição de rotas rodoviárias tradicionais.
“Como pertencemos a uma fundação, temos a liberdade de planejar ações de longo prazo e assumir maior responsabilidade em oferecer soluções sustentáveis sem aumentar os custos para o consumidor”, explicou Emma Recco.

Outro destaque é o investimento em fábricas próprias de reciclagem, incluindo uma unidade na França dedicada exclusivamente a colchões. O processo envolve recolher colchões usados, transformá-los em novos materiais e reintegrá-los na produção — um exemplo pioneiro do conceito de “reciclagem contínua”, tendência que deve se tornar central nos próximos anos.
A meta da empresa é que 100% dos produtos sejam produzidos com materiais renováveis ou reciclados até 2030.
Yamamay: inovação no design como vantagem competitiva
Representando a indústria da moda íntima, Francesco Pinto apresentou os avanços da Yamamay, que conta com 600 lojas e vende cerca de 15 milhões de peças por ano.
Desde 2013, a empresa investe em eco design e, desde 2019, publica relatórios anuais de sustentabilidade para medir e comunicar seus impactos. Atualmente, 60% da coleção é composta por produtos sustentáveis ou inovadores.
Francesco defendeu o co-design como uma estratégia essencial para unir sustentabilidade e competitividade:
“Se queremos mudar o mundo, precisamos mudar nossos produtos e a forma como os produzimos. O co-design permite usar menos materiais e componentes, gerando mais valor, eficiência e melhor performance”, destacou.
A empresa também utiliza tecnologia para mapear o impacto ambiental em seis dimensões, incluindo emissões de CO₂, consumo de água e origem dos materiais. Além disso, instalou sistemas inteligentes em suas lojas, reduzindo entre 15% e 30% o consumo de energia.
Desafios do setor: regulamentação e colaboração
Os executivos ressaltaram que a regulamentação europeia é fundamental, mas frequentemente lenta e complexa, dificultando a adaptação das empresas.
Emma destacou que, na França, iniciativas como o EPR Scheme têm estimulado a cooperação entre governo, empresas e organizações para estruturar a economia circular de forma mais eficiente.
Outro desafio mencionado foi a escassez futura de materiais recicláveis, o que exige investimentos conjuntos em fábricas e tecnologias de reaproveitamento.
A IKEA, por exemplo, atua diretamente nesse segmento para garantir a disponibilidade de insumos sustentáveis nos próximos anos.
Camille acrescentou que é essencial contar com dados e indicadores robustos para comprovar o retorno sobre o investimento em sustentabilidade, transformando o tema em uma prioridade estratégica.
O consumidor e o dilema da escolha
Embora pesquisas indiquem que os consumidores valorizam marcas sustentáveis, o comportamento de compra nem sempre reflete essa intenção.
Francesco apontou que, para competir com plataformas de fast fashion, como Shein e Temu, é necessário combinar sustentabilidade, inovação e preços acessíveis. Somente assim será possível oferecer valor real e conquistar a nova geração de clientes.
“Sustentabilidade sozinha não vende. É preciso unir performance, acessibilidade e design para que o cliente perceba o benefício”, afirmou Francesco Pinto.
Futuro colaborativo e circular
O futuro do varejo sustentável depende de colaboração em toda a cadeia, incluindo governos, empresas e consumidores. Investir em modelos circulares, inovação tecnológica e educação do consumidor será essencial para que a sustentabilidade se torne um padrão no setor.
“O futuro do varejo será construído coletivamente. É preciso unir forças para criar soluções que beneficiem o planeta e os negócios”, finalizou Charlotte Hardie.
Imagens: Elifas de Vargas
*Em colaboração com Amanda Dechen