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O futuro do varejo brasileiro depende de mais do que tecnologia

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O varejo brasileiro vive um paradoxo: ao mesmo tempo em que abraça a digitalização e se entusiasma com as promessas da inteligência artificial (IA), ainda tropeça em barreiras antigas que limitam seu pleno potencial de crescimento. O setor fechou 2024 com um avanço de 4,7% nas vendas, mas os sinais de 2025 indicam um ritmo mais moderado, com crescimento de apenas 2,1% em maio — abaixo dos 2,4% registrados no mesmo mês do ano anterior. O entusiasmo com a transformação digital contrasta com os desafios estruturais que persistem.

Relatório recente da Infor, com base em dados próprios e de mais de 30 fontes nacionais e internacionais, aponta que a digitalização do varejo deve movimentar mais de US$ 285 bilhões globalmente em 2025. No Brasil, 64% das empresas já tratam a IA como prioridade estratégica, e quase metade (47%) afirma utilizá-la em suas operações. Ainda assim, a lacuna entre intenção e execução é significativa: falta maturidade tecnológica, investimentos robustos em APIs e sistemas de gestão, além de infraestrutura capaz de sustentar a transição para um varejo realmente integrado.

É nesse contexto que o conceito de varejo phygital — a integração entre experiências físicas e digitais — ganha força. O consumidor brasileiro já dá sinais claros dessa mudança: 36% fizeram sua última compra pelo celular, a maior taxa entre os oito países analisados por um estudo da PYMNTs. Porém, o e-commerce ainda representa menos de 10% do varejo total, um desempenho tímido diante das médias da China e dos Estados Unidos. O recado é claro: há espaço para crescer, mas os obstáculos não são triviais.

Os principais entraves passam por uma logística deficiente, fretes caros e a dificuldade crônica de integração entre canais — um desafio que o omnichannel ainda não conseguiu vencer. Soma-se a isso a baixa qualificação da mão de obra e uma cultura digital pouco desenvolvida. Segundo a FGV, seis em cada dez empresas enfrentam dificuldades para contratar ou reter talentos, um dado alarmante que escancara o despreparo estrutural diante das exigências da nova economia.

Mesmo diante desse cenário desafiador, há luz no horizonte. O mercado brasileiro de tecnologias imersivas, como realidade aumentada (AR), deve saltar de US$ 250,9 milhões em 2024 para US$ 2,7 bilhões até 2035, com taxa de crescimento anual superior a 24%. E não se trata de uma aposta vazia: mais de 30% dos consumidores brasileiros se dizem mais propensos a comprar após interações com AR, mostrando que tecnologia e experiência de consumo caminham juntas.

A automação também avança. Ferramentas como WMS, RFID e checkouts automáticos têm potencial para reduzir custos operacionais e, no longo prazo, ajudar a diminuir o chamado “Custo Brasil”, que hoje consome até 12% do PIB. Não por acaso, 79,3% dos empresários brasileiros afirmam que pretendem ampliar em 20% ou mais os investimentos em tecnologia nos próximos anos.

No entanto, sem resolver os gargalos estruturais, todo esse investimento pode se perder em promessas não cumpridas. A verdadeira transformação do varejo brasileiro não será apenas tecnológica — ela exigirá um salto cultural, educacional e logístico. A inovação precisa deixar de ser um projeto de PowerPoint e se tornar uma realidade operacional, inclusiva e escalável. E isso começa por onde sempre deveria começar: pelas pessoas.

Imagem: Envato


*Rebecca Fischer é co-fundadora e CSO da Divibank, fintech brasileira que apoia o crescimento de PMEs por meio de soluções de meios de pagamento e orquestração de pagamentos, com foco em eficiência, conversão e simplicidade operacional para o e-commerce.

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