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Omnicanalidade na Black Friday: uma estratégia rentável
A Black Friday deixou de ser o pico de vendas isolado para se tornar uma maratona de eficiência logística e tecnológica que define o sucesso do ano. Nos últimos anos, observamos uma crise de confiança por parte do consumidor, que, em meio à inflação e à alta dos juros, tornou-se mais seletivo e menos tolerante a falhas.
O evento, que deveria ser a grande alavanca de lucro, virou um campo minado de problemas: fraude nos preços, atrasos na entrega e rupturas de estoque. É neste cenário de desconfiança e competição acirrada que a estratégia de canais isolados, o varejo que separa o online do offline, atinge seu ponto de falência. A verdade que o mercado precisa encarar é que a Omnicanalidade ou, melhor ainda, o unified commerce, não é mais uma opção de luxo, mas sim a única base sólida para garantir a rentabilidade e a confiança do cliente.
O consumidor de hoje já é híbrido por natureza. Ele não se importa com qual sistema de gestão sua empresa utiliza; ele exige que a experiência seja coesa. Ele pesquisa no app, compra no e-commerce e, idealmente, retira na loja física sem que haja qualquer atrito. Quando essa jornada se fragmenta, seja por uma falha de estoque não comunicada ou por uma promessa de prazo quebrada, o prejuízo é catastrófico. Esse custo não é apenas a venda perdida; ele se multiplica no Custo de Aquisição de Cliente (CAC) desperdiçado e na perda de confiança, o ativo mais valioso na Black Friday ou qualquer outra data sazonal. Além disso, em um cenário de juros altos e alta demanda por capital de giro, a fragmentação logística é uma aposta que o varejo não pode pagar. A falta de um sistema unificado força o varejista a carregar o dobro de estoque nas pontas e no Centro de Distribuição, amarrando capital que deveria estar em giro.
É fundamental entender que o mobile commerce amplifica este desafio. Com mais de 72% do tráfego de vendas vindo de smartphones (Appreach, 2024), a agilidade e a precisão na informação são essenciais. Se o cliente finaliza uma compra pelo celular e a entrega falha, a experiência se perde. O unified commerce é a resposta definitiva a essa crise. Ele é a única força capaz de garantir que o estoque certo esteja no lugar certo, na hora certa, transformando cada loja em um ativo logístico e maximizando o capital de giro.
Por isso, a abordagem que tratava a omnicanalidade como um projeto de TI precisa ser substituída por uma visão executiva que a enxerga como a principal estratégia de eficiência e rentabilidade para a Black Friday.
O OMS como cérebro do unified commerce
O erro mais comum é limitar o omnichannel à “vitrine infinita”. O verdadeiro poder está no backstage. É aqui que o OMS atua como o cérebro que orquestra a operação:
- Estoque unificado é a chave: o OMS transforma cada loja física em um mini-CD. Isso não só amplia a prateleira virtual, mas permite que o varejista use o estoque mais próximo do consumidor para reduzir custos logísticos e acelerar o prazo de entrega.
- Frete estratégico: A inteligência do sistema permite o uso de heurística de frete, com leilão entre transportadoras, que garante o trade-off ideal: o melhor prazo com o menor custo. Isso é crucial para manter a margem alta durante a guerra de preços da Black Friday.
- Compromisso e confiança: O unified commerce é a promessa de que o sistema de vendas (o e-commerce) e o sistema de entrega (o OMS/Logística) estão 100% sincronizados. Essa coerência é o que garante a confiança do cliente.
A logística como fator de ruptura e NPS
A velocidade de entrega se tornou um fator determinante para a satisfação do cliente, superando, em alguns casos, o preço. Uma pesquisa do Capterra (2022) revelou que mais de dois terços (73%) dos entrevistados consideram o serviço de entrega ultrarrápida (q-commerce) relevante, à frente até do preço e do atendimento na decisão de compra.
A logística, portanto, é a nova métrica de CX (Customer Experience). Um OMS estratégico é o que mitiga essa ruptura, pois a incapacidade de gerenciar a entrega adequadamente é a principal causa de reclamações e detratores. A falha logística não só perde a venda atual, mas 62% dos consumidores não retornam a um site após uma experiência ruim de entrega (Central do Varejo, 2024), afetando diretamente o NPS (Net Promoter Score).
A loja física no mobile commerce
O papel da loja física no Mobile Commerce é mais vital do que nunca. A loja não é um concorrente, é um ativo logístico e de relacionamento. Estudos mostram que 30% dos consumidores pretendem fazer suas compras de Black Friday nas lojas físicas.
Criar opções de retirada na loja (Pick Up In Store) e usar o estoque do ponto de venda para atender pedidos digitais (Ship From Store) são estratégias essenciais. O Ship From Store economiza tempo e pode reduzir custos operacionais em até 30% (McKinsey), transformando o vendedor em um agente de distribuição e o estoque parado em capital de giro.
Fidelizar na coerência, não no desconto
A Black Friday é o maior evento de aquisição, mas o desafio de um líder é a retenção. O cliente que teve uma experiência fluida, sem falhas de estoque ou atrasos, é o que retorna com maior Lifetime Value (LTV). O desconto pode até garantir a venda, mas não garante um retorno se você não entregar a melhor experiência.
Para os próximos anos, a exigência será por perfeição na execução unified commerce. O varejo que não investir em sistemas que garantam a unificação do estoque e da jornada não terá a rentabilidade necessária para sobreviver. A Black Friday é o teste de estresse que prova quem está, de fato, preparado para o futuro.
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Imagem: Freepik

*Felipe Pavoni é Sócio e Co-Fundador da LEAP, e possui amplo conhecimento em operações de e-commerce, marketing digital, marketplace, CX e todo o ecossistema de produtos digitais. Foi executivo de empresas como Centauro, C&A, Boticário e Saraiva, que agregaram em sua experiência prática. Tem uma carreira dedicada a projetos de Digital e E-commerce agregando uma visão 360 graus de Performance, Marketing, CRM, Produtos, Tecnologia e Experiência do Cliente.
