Economia
Como a alta do dólar impacta o varejo?

O dólar tem tido sucessivas valorizações no Brasil nas últimas semanas. Na última quarta-feira, a moeda americana fechou em R$ 6,26, valor mais alto desde a criação do real. O crescimento, na data, havia sido de 2,82%, também a maior em dois anos. Ontem, o dólar fechou em R$ 6,12, após intervenções do Banco Central (BC).
A alta da moeda americana assusta não só quem pretende viajar para o exterior nesse momento, mas também todas as transações comerciais de importação de produtos estrangeiros. Com isso, o peso desse aumento pode chegar até mesmo no bolso dos consumidores finais, e o varejo pode ser um grande afetado.
De acordo com o professor de Economia Antonio Santos, a alta histórica do dólar tem muitos fatores, entre eles, as expectativas do mercado financeiro com a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos. “Desde as eleições norte-americanas está acontecendo uma readaptação das expectativas dos agentes econômicos. O Trump tem um perfil mais desenvolvimentista, tem essa vontade de reindustrialização, então muitas empresas estão repatriando dólares para os Estados Unidos”.
Com base na lei da oferta e da demanda, quanto mais investidores tiram dólares do Brasil e devolvem para os Estados Unidos, mais a moeda americana se valoriza em relação ao real. Segundo Santos, outros fatores internacionais também contribuem para essa alta, como a continuação das guerras da Ucrânia e de Israel.
Quanto aos fatores internos, um pronunciamento do ministro Fernando Haddad no final de novembro fez com que a confiança do mercado financeiro no Brasil se abalasse. Entre as medidas anunciadas por Haddad, estão uma economia pretendida de R$ 70 bilhões proveniente da limitação do aumento real do salário mínimo, maior controle do acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), reformulação do abono salarial, instituição de idade mínima para que militares passem para a reserva e limitação de transferência de pensões das Forças Armadas, combate aos altos salários do funcionalismo, etc. As mudanças, porém, ainda têm que tramitar no Congresso Nacional para serem aprovadas.
Além dos anúncios de contenção de gastos, Haddad apresentou no mesmo dia a proposta de isentar do Imposto de Renda pessoas que ganham até R$ 5 mil, como parte da Reforma Tributária que será discutida no ano que vem. Essa mudança, porém, foi a que mais desagradou o mercado financeiro. “Esse aumento do dólar principalmente acaba surgindo quando a gente tem essas discussões do novo pacote fiscal e orçamento do governo”, afirma Santos.
Porém, o economista afirma que essa reação pode demonstrar uma acomodação do mercado. “A gente tem bons indicadores econômicos, com o aumento do PIB e queda do desemprego. Por outro lado, o aumento do consumo fez com que o Banco Central tente conter a inflação, aumentando a taxa de juros”.
Nesse cenário, o varejo pode acabar sofrendo com a alta da moeda americana, uma vez que o dólar é o padrão internacional para transações comerciais entre países. “Muitas vezes, mesmo um carro sendo produzido e montado no Brasil, ele depende de peças importadas. Vai haver impacto, por exemplo, até no pão francês, porque o Brasil não é autossuficiente na produção de trigo. Isso vai impactar inúmeros Lojistas; no varejo, se o varejista já fez seu estoque de produtos importados talvez seja até possível não repassar esse aumento ao consumidor. Mas quem ainda vai comprar estoque agora, está no olho do furacão”, analisa Santos.
Segundo José Luís Fernandes, CEO do Grupo HOPE, essa alta preocupa os varejistas, que devem tomar cautela nas negociações nesse momento. “Qualquer alteração tanto na taxa de câmbio quanto na taxa de juros afetam os negócios em geral, direta ou indiretamente Entendemos que temos que ser muito cautelosos neste momento para entender se se trata de um movimento especulativo ou uma real mudança de patamar do câmbio. Esperamos que as coisas se acomodem rapidamente e, consequentemente, os impactos negativos possam ser absorvidos por nossa operação.”
Antonio Santos dá algumas dicas para varejistas que precisam se proteger da valorização do dólar nesse momento: “Negociar um contrato melhor com seu fornecedor, talvez de longo prazo, com um poder maior de barganha; fazer mecanismos financeiros como CDBs ou SWAPs, utilizando um bom analista financeiro; verificar se o orçamento para 2025 está preparado para a exposição ao risco com o câmbio”.
Imagem: Valter Campanato/Agência Brasil