Web Summit Lisboa 2025
Como vender o que o mercado ainda não entende: executivos debatem o novo marketing B2B
O desafio de vender inovação em um cenário em que nem o mercado nem o consumidor entendem completamente o produto foi o foco do painel “Selling the Unknown: The B2B Marketer’s Dilemma”, no Web Summit Lisboa 2025. A conversa reuniu Julie Choi, CMO da Cerebras Systems, e Neil Barrie, CEO global da 21st Century Brand, com mediação do jornalista Ryan Heath, do AI Leadership Lab Podcast.
Logo na abertura, Julie Choi trouxe um exemplo prático da complexidade de se criar uma categoria de produto em um mercado dominado por gigantes. Apresentando o Wafer Scale Engine, o maior chip já produzido, Choi explicou como a Cerebras precisou “educar o mercado” para posicionar sua tecnologia — capaz de processar dados até 20 vezes mais rápido que a Nvidia — dentro de uma nova categoria de performance em IA. “Criar uma categoria é necessário quando você é o desafiante, quando precisa mostrar que não está apenas competindo, mas redefinindo o jogo”, disse.
Neil Barrie, cuja consultoria já trabalhou com marcas como Airbnb, Pinterest e GoDaddy, complementou que a criação de novas categorias é sedutora, mas exige cuidado. “Investidores adoram ouvir que há uma nova categoria — soa como inovação e alto retorno. Mas do ponto de vista do cliente, isso pode gerar confusão. Em B2B, a maioria das pessoas que tomam decisões não domina os detalhes técnicos. Pedir que entendam algo novo pode ser um obstáculo”, observou. Segundo ele, quando não há um diferencial realmente disruptivo, “é melhor ajustar e reposicionar o que o público já entende, em vez de tentar reinventar o dicionário”.
Questionados sobre o que significa “marca” em um contexto B2B, Choi resumiu: “Marca é emoção. É fazer o cliente sentir algo sobre o que você faz”. Ela explicou que, mesmo em empresas altamente técnicas, a comunicação deve ter alma e clareza. “Em vez de três páginas, defina sua marca em três palavras. O cliente precisa sentir quem você é antes mesmo de entender o produto”, afirmou.
Barrie completou que uma marca forte é, acima de tudo, um instrumento de alinhamento interno. “Branding não é só logo ou campanha. É uma ferramenta de liderança — uma forma de garantir que milhares de decisões diárias dentro da empresa sigam o mesmo propósito. É experiência antes de ser marketing”, afirmou.
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Com a ascensão da inteligência artificial e ciclos de mudança cada vez mais rápidos, ambos defenderam que a marca se torna um ponto de ancoragem para empresas em transformação constante. “Brand é como você aparece todos os dias, em cada interação”, disse Choi. “Se o mundo muda o tempo todo, a consistência se torna o que gera confiança.” Barrie concordou e destacou que, num cenário de sobrecarga informacional, as marcas funcionam como atalhos mentais. “Decisores estão sobrecarregados. A marca serve para simplificar o entendimento — um lembrete instantâneo do porquê você existe.”
O painel avançou para o impacto da IA no conteúdo de marketing. Choi alertou que o uso indiscriminado de ferramentas generativas pode gerar “lixo criativo”, reduzindo a diferenciação entre marcas. “A IA escreve o que é mais comum. Então, se todos usarmos os mesmos prompts, vamos acabar soando iguais. A marca é o que diferencia o humano por trás do texto”, afirmou.
Barrie reforçou que, diante da homogeneização do conteúdo, a autenticidade humana se torna vantagem competitiva. “Estamos na era da IA generalista. As marcas precisam de algo único — um ponto de vista humano que nem o algoritmo pode copiar”, disse.
Ambos também defenderam a importância do storytelling centrado no cliente. “Em B2B, é comum falar de produto, não de pessoas. Mas são as histórias humanas que conectam”, explicou Barrie. Ele citou o exemplo de uma campanha criada para a GoDaddy que redefiniu seu público como “empreendedores do dia a dia”. “Deixar de ver o cliente como um cluster e passar a enxergá-lo como um indivíduo muda tudo: tom, empatia, narrativa.”
Choi completou com uma visão prática: “Vejo muitos fundadores e engenheiros que não valorizam o marketing até ser tarde demais. Por isso, digo aos meus clientes: pensem em nós como o seu time de marketing. Nosso trabalho é representar vocês para o mundo — e fazer isso com precisão e humanidade.”
Ao olhar para o futuro, os executivos concordaram que o marketing de 2026 exigirá curadoria inteligente e foco em primeiro princípio. “Há muito barulho em torno da IA, mas poucos conseguem distinguir o sinal do ruído. As marcas vencedoras serão as que combinarem curiosidade com foco — testar novas tecnologias sem perder de vista o que realmente gera valor”, disse Barrie.
Choi acrescentou que o vídeo é hoje o formato mais eficaz para engajamento B2B. “Não temos um estúdio interno, mas com IA e uma equipe pequena, conseguimos criar vídeos de altíssimo impacto. O segredo não é tamanho de equipe, é clareza de mensagem”, explicou, destacando o uso de ferramentas generativas para otimizar a produção audiovisual.
Nos minutos finais, ambos citaram marcas que, na visão deles, alcançaram o equilíbrio ideal entre tecnologia e propósito. Barrie destacou o Pinterest, elogiando sua coerência entre propósito, produto e comunicação: “Eles têm uma missão clara — inspirar as pessoas a criarem a vida que amam — e traduzem isso em tudo, do branding ao B2B”. Choi, por sua vez, escolheu a Apple, citando a influência da área de marketing na cultura da empresa. “A Apple prova que o marketing pode liderar a tecnologia — não o contrário”, afirmou.
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Imagens e informações: Vanessa Romanello, embaixadora do MBA USP/Esalq
