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Os oito desafios que devem ser superados para a estruturação de uma área de inteligência
Em 2009, os autores do livro Fundamentos da Inteligência Competitiva, na página 13, sintetizaram o desafio humano de para entender o que estava acontecendo da seguinte forma:
“Diariamente, acontecem fatos demais à sua volta para que o ser humano possa entender tudo. Sua capacidade é limitada para perceber todos os detalhes existentes no ambiente. Os processos cerebrais nos impedem de “ver” ou perceber determinados casos. Nossos modelos mentais atuam como filtros em nossas percepções, reduzindo ou dando interpretações equivocadas aos acontecimentos.”
Se os autores descrevem o contexto de 2009 da forma acima, imagina se fosse em 2020, quando começou a pandemia? Não por acaso, é comum os profissionais da área comercial do varejo descreverem suas rotinas como bombeiros, ou seja, estão sempre apagando incêndios e tendo que equilibrar vários pratos.
O desafio é que, neste mundo Volátil, Incerto, Complexo (VUCA no acrônimo em inglês) ou frágil, ansioso, não linear e incompreensível (BANI em inglês), os profissionais da área comercial estão tendo que tomar muito mais decisões em um menor espaço de tempo e há riscos neste processo.
Daniel Kahneman, um estudioso da economia comportamental e autor do livro Rápido e Devagar descreve dois sistemas de forma de pensar: rápida e devagar.
O pensar rápido é um sistema que opera automaticamente e sem esforço e é utilizado para realizar tarefas rotineiras e que nos guia quando estamos cansados. O pensar rápido tende a acreditar em tudo que lhe parece familiar. É com ele que tiramos conclusões precipitadas.
O pensar devagar é um sistema que requer lentidão, deliberação, raciocínio e concentração. É ele o responsável por duvidar das informações que recebemos e tem a habilidade de avaliar cenários. É ele quem duvida da intuição e das histórias que escuta. Mesmo quando vem de pessoas que lhe são familiares. Costuma suspender o possível julgamento sobre um fato.
E como apoiar o time da área comercial a tomar melhores decisões? O melhor é caminho é desenvolvendo uma área de inteligência para que se tenha uma visão holística, que consiste em olhar a Organização como um todo, como uma espécie de luneta, ampliando pontos que podem passar desapercebidos, mas que fazem toda a diferença para o negócio.
Com esta importante missão, a Área de Inteligência foi desenvolvida, procurando ouvir as dores do time de Vendas, as demandas do Comercial e os anseios da Diretoria, e então, mais experiências somadas. Começar algo do zero e poder vislumbrar os frutos que a Área trouxe é uma das maiores conquistas que um profissional pode ter e aqui apresentamos algumas das dificuldades encontradas.
São inúmeros os desafios para implementar a área de inteligência de mercado, seguem pontos importantes a serem considerados:
- Entender o conceito da área, alinhado ao planejamento estratégico da empresa, fazendo com que Missão, Visão e Valores vão de encontro com o profissional a frente da área e evidentemente com os interesses da companhia.
- Quebrar paradigmas, daquilo que sempre foi feito desta forma. Tonar explícita a cultura organizacional, presente em seus valores, prioridades e hábitos;
- Selecionar as fontes, pois somos tomados por dados, organizados ou não de todos os lados. “Quem vê tudo não vê nada”, e a oferta é gigantesca;
- Entender a fundo as metodologias dos provedores de informação, com seus pontos positivos e negativos, isto nos ajudará a escolher o provedor que melhor atenderá as dores daquele momento. Há peculiaridade do negócio que o profissional de inteligência conhece melhor e precisa questionar o provedor antes de disseminar informações para garantir a credibilidade e confiança no sistema de informações;
- Traduzir as informações que os provedores trazem segundo a árvore mercadológica da organização. Quanto mais familiar for esta construção maior será a adesão dos usuários;
- Contar com recursos tecnológicos que diminuam a carga de trabalho operacional;
- O trânsito entre as áreas é de vital importância para o sucesso da área, seja Compras, Vendas, Mkt/Trade/Merchan, Gestão de estoques estão entre as principais áreas onde esta interação deve ser a melhor possível;
- Desafio de se manter atualizado e alinhado com as questões estratégicas do negócio
O desenvolvimento da área de inteligência é fundamental, mas o desafio do tempo continua. Como sabemos, o smartphone e as redes sociais empoderam o cliente que, com a pandemia, se tornou mais digital que antes e com muito mais opções no mix de produtos e locais de compra. O desafio de todos é colocar o cliente no centro e tomar melhores decisões com base em dados e fatos porque decisões rápidas, tomadas no piloto automático, não embasadas, podem fazer com que nos tornemos irrelevantes para os clientes e não alcancemos os resultados esperados.
Para finalizar, cabe dizer que não há “bala de prata”, mas sempre devemos nos questionar e procurar soluções para as perguntas: como analisar tantas informações? O que devemos priorizar neste sentido? O que é mais importante? Onde é o limite entre a Inteligência de Mercado em prover a informação, mas não recomendar? Qual o papel e responsabilidade de cada área? Como avançarmos com um time multidisciplinar com uma perspectiva sistêmica e colaborativa? Será que deveriam ser contratadas mais pessoas para atuar na área comercial ou mais analistas de Inteligência de Mercado para fazer mais recomendações assertivas? A única certeza é de que na era da velocidade, os profissionais precisam ser orientandos por fatos e dados.
Imagem: Envato
*Olegário Araújo tem dedicado a sua vida profissional em transformar dados em conhecimento acionável para ampliar a compreensão do contexto e o estabelecimento de uma linguagem comum para que os líderes do varejo possam conectar todos os pontos e estabelecer diálogos colaborativos com objetivos, metas e compromisso com a execução.
Em sua trajetória, Olegário atuou em empresas de pesquisa por 20 anos, sendo 15 deles na Nielsen (NIQ), onde foi Key Account Manager, gerente nacional e diretor de varejo. Cofundador da inteligência360; consultor em inteligência de negócio; professor e pesquisador do FGV CEV; cocurador de conteúdo nos canais supermercado e farma; graduado em administração pela PUCSP; MBA em gestão pela FIA USP; mestrado acadêmico pela FGV EAESP na linha de marketing; certificado de Conselheiro consultivo pelo CELINT e; pós-graduação em Neurociências e comportamento humano pela PUCRS.