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Consumidores demonstram pessimismo com a economia, mas mantêm ritmo de compras nos Estados Unidos
Apesar da queda no sentimento do consumidor e do aumento das demissões, os consumidores dos Estados Unidos continuam sustentando o crescimento das vendas no varejo. Dados recentes mostram forte movimento nas lojas físicas e nos canais on-line durante o período entre o Dia de Ação de Graças e a Cyber Monday, tradicional início da temporada de compras de fim de ano no país.
De acordo com levantamento da National Retail Federation (NRF), cerca de 203 milhões de consumidores realizaram compras nesse intervalo de cinco dias, o maior volume registrado em pelo menos nove anos. O resultado ocorreu em um contexto de confiança do consumidor em patamares baixos. Pesquisa mensal da Universidade de Michigan indicou que o sentimento caiu para o menor nível em mais de três anos no início de novembro, com leve recuperação em dezembro.
Mesmo diante desse cenário, grandes redes varejistas apresentaram desempenho acima do esperado. Empresas como Walmart, Best Buy e Costco superaram as estimativas de vendas trimestrais de Wall Street. Redes voltadas ao consumo discricionário, como Gap, Abercrombie & Fitch e American Eagle, também reportaram resultados superiores às projeções e afirmaram que a demanda se manteve estável.
“Eu sei que todo mundo está procurando rachaduras na saúde do consumidor”, afirmou o diretor financeiro do Walmart, John David Rainey, em entrevista à CNBC no fim de novembro. “Para nós, parece bastante consistente.”
Executivos do setor também relataram que consumidores de renda mais baixa continuam ativos, apesar das pressões econômicas. “A manchete é que nos sentimos muito bem em relação ao consumidor de menor renda”, disse Michael O’Sullivan, CEO da Burlington Stores, ao comentar os resultados trimestrais da empresa. “Esse consumidor tem sido muito resiliente.”
Entre os fatores que sustentam o consumo estão o baixo nível de desemprego, mesmo com sinais de desaceleração do mercado de trabalho, e o gasto das famílias de renda mais alta, beneficiadas pela valorização dos imóveis e pelos ganhos do mercado financeiro. Em novembro, a economia dos Estados Unidos criou mais vagas do que o esperado, mas a taxa de desemprego atingiu o nível mais alto em quatro anos, segundo dados oficiais divulgados com atraso. Informações da ADP indicaram perda de postos de trabalho no setor privado no mesmo período.
Além disso, o consumo durante as festas de fim de ano tende a ser priorizado pelas famílias, mesmo que isso implique redução de outros gastos ou aumento do uso do crédito. Marcus Feldman, gerente de projetos de biotecnologia em Cambridge, no estado de Massachusetts, afirmou que pretende gastar cerca de 15% a mais neste ano. “É em parte porque podemos e em parte porque a vida é curta e os meninos só são pequenos uma vez”, disse.
O CEO da NRF, Matthew Shay, afirmou em conversa com jornalistas no início de dezembro que existe “uma espécie de proteção” em torno dos gastos de fim de ano. “Um dos principais fatores é que, para muitos americanos e muitas famílias, o consumo e as compras de fim de ano são uma parte essencial do orçamento”, afirmou.
Ainda assim, há sinais de pressão. Varejistas têm observado consumidores mais seletivos e em busca de descontos. Segundo a Adobe Analytics, a procura por promoções impulsionou o desempenho de datas como Black Friday e Cyber Monday. Parte do crescimento das vendas também está associada a aumentos de preços, que persistem mesmo com a desaceleração da inflação.
O economista-chefe da Raymond James, Eugenio Aleman, atribui o baixo sentimento do consumidor à alta de preços acumulada nos últimos anos. Segundo ele, isso tem antecipado algumas decisões de compra. “Mesmo se sentindo mal, eles dizem: ‘Ok, tenho que fazer o que for preciso para comprar agora’”, afirmou.
Especialistas apontam uma divergência entre o que os consumidores dizem e o que efetivamente fazem. Ali Furman, líder de mercados de consumo nos Estados Unidos da consultoria PwC, afirmou que essa diferença vem sendo observada desde 2021. Segundo ela, famílias de renda mais alta e moradores das costas Leste e Oeste tendem a manter os gastos, mesmo relatando baixo nível de confiança.
Empresas, por sua vez, adotam postura cautelosa. A NRF projeta que a contratação de trabalhadores temporários para o fim de ano será a menor em pelo menos 15 anos, reflexo dos custos mais elevados e das incertezas relacionadas a tarifas. Redes como Macy’s e Costco também destacaram a dificuldade de identificar padrões consistentes de consumo, apesar de resultados positivos.
Ao mesmo tempo, varejistas focados em preço têm atraído consumidores de renda mais alta. Redes como Walmart, Dollar General e T.J. Maxx registraram aumento desse público, em busca de economia. Para o professor de marketing da Universidade de Georgetown Luc Wathieu, o cenário reflete um paradoxo. “É um pouco como dançar no Titanic antes de ele afundar, certo?”, disse. “Não sabemos o que vai acontecer. Então, vamos viver a vida enquanto isso.”
Dados da Salesforce indicam que, durante o feriado de Ação de Graças, o preço médio de venda subiu 6% em relação ao ano anterior, enquanto o volume de pedidos cresceu 2% no mundo e 1% nos Estados Unidos. Para Omair Tariq, CEO da Cart.com, parte do crescimento do setor está mais relacionada à inflação do que à expansão real da demanda. “A conversão caiu, o volume de pedidos caiu”, afirmou. “Mesmo durante a Black Friday e a Cyber Monday, o crescimento ficou em um dígito baixo.”
Apesar disso, consumidores seguem priorizando gastos com presentes. Andre Lewis, motorista de transporte por aplicativo em Nova York, afirmou que reduziu despesas pessoais para garantir as compras de fim de ano para a filha. “Quero que ela sinta que o mundo é cheio de possibilidades”, disse.
Imagem: Envato
Informações: Melissa Repko e Gabrielle Fonrouge para CNBC
Tradução livre: Central do Varejo
