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Comportamento

Exclusivo: conheça um supermercado operado por mulheres

A loja fica no interior de Santa Catarina, e oferece benefícios como licença maternidade estendida e treinamentos para diversas funções

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Fachada do Super das Frutas; supermercado operado por mulheres

O supermercado Super das Frutas, em Balneário Arrio do Silva (SC), abriu em novembro de 2022 uma unidade do supermercado operado por mulheres, visando combater a desigualdade de gênero. Hoje, depois de quase 1 ano e meio de operação, a Central do Varejo conversou com Gabriele Salvetti, diretora do supermercado, para saber sobre os resultados da iniciativa. Acompanhe a conversa na íntegra:

Como surgiu o supermercado operado por mulheres?

Nosso supermercado existe há 16 anos, e é uma empresa familiar. Quem fundou a loja foram meus pais, e hoje quem administra as lojas somos eu e meu irmão mais velho. A gente tinha uma loja matriz aqui em Balneário Arroio do Silva, em Santa Catarina, e a gente decidiu em 2022 abrir uma segunda loja, dessa vez com algum impacto social e sustentável.

E então foi aí que a gente pensou nas mulheres. Pensamos nelas porque a gente sabe que existem muitas vagas de emprego para mulheres, mas poucas vagas de liderança. E a gente sabe que as mulheres têm horário limitado, porque têm que cuidar da família, da casa, quando engravidam nenhuma empresa gosta disso. 

Só que pra isso a gente teve que dar todo o treinamento, porque a gente não encontra mulheres gerentes, subgerentes, chefe de loja, encarregado de açougue, conferente de doca, que faz descarga de caminhão, operadora de empilhadeira, etc. Então a gente passou 2022 inteiro procurando mulheres que queriam essa oportunidade, e a gente começou diversos tipos de treinamento.

E aí em novembro de 2022 abrimos esse supermercado operado por mulheres 100%. Eram cerca de 140 mulheres para a inauguração, em todos os cargos. Hoje, quando sai uma funcionária de um cargo de liderança, por exemplo, de gerência, eu não consigo encontrar uma mulher da noite para o dia, demora muito, porque muitas vezes também é preciso passar por um treinamento. Então, às vezes, é preciso contratar um homem, porque é mais fácil de achar. Mas entre 100 funcionários atualmente operando na loja, só quatro são homens. Nós priorizamos a contratação de mulheres nas duas lojas, e numa terceira que estamos abrindo. Acho que são 75% de mulheres com duas lojas.

Desenho de mulher negra forte na parede do Super das Frutas

Como surgiu essa ideia?

Essa ideia surgiu através do meu irmão, Lucas, e daí a equipe e a diretoria toda abraçou. Nossa loja é também toda voltada para a causa, com as paredes  decoradas com desenhos e frases com esse impacto feminino.

Quais foram as dificuldades de vocês nesse percurso?

A principal dificuldade é quando uma colaboradora sai e ela é de algum cargo de chefia. Para conseguir outra demora muito tempo. Até dar o treinamento e até ela ter a cultura da empresa, demora no mínimo seis meses. Às vezes, a gente tem cinco candidatos homens e nenhuma mulher, então a gente tem que procurar. Não vem uma mulher na nossa direção, se a gente tivesse diversas candidatas mulheres isso não ia acontecer, mas infelizmente a gente só tem candidatos homens.

Como as funcionárias se comportaram nestes cargos incomuns para as mulheres?

Eu tenho uma uma chefe do açougue. Ela começou como auxiliar de açougue, virou açougueira e hoje é líder de açougue, e ela é ótima. As funcionárias gostam muito, porque elas sentem que a loja é delas. Se alguém reclamar, elas defendem a loja. 

Em relação às funções de reposição, estoque, e tudo mais, elas se adaptaram bem. A gente tem as paleteiras, empilhadeira para carregar para um lado e para o outro, então isso é bem tranquilo, não tem mais aquele negócio de levar tudo nas costas 

Os resultados do supermercado matriz e da filial são parecidos em relação ao faturamento e à adesão dos funcionários?

Agora as coisas são parecidas. Mas, no começo, por exemplo, no açougue, muitos clientes têm um costume de comprar com um açougueiro homem que está há 10 anos no cargo, e não querem comprar com mulheres, porque acham que elas não têm conhecimento nisso.

Só que agora, com o passar do tempo, a loja do supermercado operado por mulheres já começou a ter os mesmos números da matriz.

Vocês já receberam algum tipo de hate por causa da iniciativa desse supermercado operado por mulheres? 

Horrores. Recebemos até de próprias mulheres, falando que essa causa era ridícula, ‘como é que a gente vai fazer uma loja só de mulher se a gente quer conseguir igualdade de gênero’, dizendo que a gente vai favorecer um grupo só, etc.

prints de hates que o Super das Frutas para mulheres recebeu

Como vocês lidam com questões que geralmente são dificultadoras para a contratação de mulheres (ex. dificuldades de horário e a maternidade)?

Um dos nossos benefícios para as mulheres que trabalham com a gente é a licença maternidade prolongada. Ao invés de quatro meses, a mulher ganha seis. E quando ela retorna, a criança já tem seis meses, daí consegue botar numa creche e retornar para o trabalho. A gente sabe que quatro meses é pouco tempo, e, às vezes, não tem suporte da família, do marido e muitas acabam pedindo as contas. 

A gente também teve uma creche até novembro do ano passado, para que as mães que tivessem filhos acima de seis meses até três anos três anos e 10 meses pudessem deixar lá gratuitamente. Depois dos três anos e 11 meses tinha que ir para escola obrigatória, conforme a legislação. E durante o tempo da creche as mães podiam amamentar e visitar os filhos em qualquer horário.

Porém, tivemos muitos problemas na alta temporada e tivemos que fechar em novembro. Agora, que passou o verão, se eu conseguir uma pessoa que consiga cuidar das crianças, posso reabrir a creche, caso haja demanda.

A gente tem plano de saúde também; para as gestantes, sai totalmente gratuita a cesariana no hospital particular.

Como funciona a sustentabilidade no supermercado?

A gente tem várias ações sustentáveis, como a troca de óleo, captação da chuva para manter os banheiros dos mercados, placas solares, oferecimento exclusivo de caixa de papelão para o cliente botar mercadoria dentro. 

Em relação ao desperdício de alimentos, a gente tem um restaurante, que todos os alimentos, quando começam a ficar mais batidos, são transformados e levados pra lá. O restaurante custa 20 e poucos reais livre. Funcionários e suas famílias pagam 10 reais.

A gente também tem aqui no supermercado o setor de corte de transformação do produto. Então, por exemplo, o alface, se ele tem uma ou duas folhinhas pretas, acaba que muita gente joga fora. A gente faz uma salada para vender em bandejas. A gente faz salada de batata, cenoura, suco de laranja. O desperdício é zero. E o mais legal é que os clientes adoram. Tudo que é descascado, picado e botado no potinho vende muito mais.

Quais são os planos para o futuro?

Algumas novidades para 2024 são nossa nova loja e a nossa Faculdade Corporativa Super das Frutas. A gente vê muitos mercados que focam muito no treinamento de liderança. Mas e o pessoal do piso de loja? Nossos treinamentos são voltados tanto para o piso de loja quanto para funções de liderança.

Essa faculdade corporativa é um aplicativo que o funcionário entra com CPF e tem diversos vídeos. Os treinamentos são parecidos com o TikTok, de 1 a 2 minutos para captar melhor a atenção. E são vídeos in loco, gravados na loja, para o colaborador se familiarizar mais ainda com a empresa que ele vai trabalhar.

Ilustrações de mulheres no Super Hiper das Frutas

Imagens: Divulgação/Acervo da empresa