Inovação
Inteligência Artificial afeta mais mulheres no mercado de trabalho
Segundo especialista, são necessárias políticas assertivas de treinamento, desenvolvimento, e de diminuição da jornada tripla das mulheres, para que as desigualdades diminuam
De acordo com um relatório da McKinsey, Inteligência Artificial afeta mais mulheres 1,5 vezes mais, precisando encontrar uma nova função. Isso ocorre porque as mulheres ocupam a maior parte das funções de baixa remuneração, mais fáceis de serem substituídas, como é o caso do atendimento. Segundo a pesquisa, até 12 milhões de trabalhadores terão que procurar novos empregos até 2030. Pessoas negras e hispânicas também vão ser duramente afetadas, pela diminuição da necessidade de trabalhadores no setor de alimentos. Para falar sobre o assunto, a CV conversou com Noemi Sakitani – Head de Recursos Humanos para América Latina da Connectis. Acompanhe a entrevista na íntegra:
Em quais funções a Inteligência Artificial já substituiu humanos?
Acredito que a automação e a Inteligência Artificial são mais eficazes em funções que envolvem tarefas repetitivas ou que podem ser reduzidas a algoritmos predefinidos, essencialmente modelos rígidos de tomada de decisão, onde a análise humana não é uma necessidade crítica para a tomada de decisões. Um exemplo notável nesse sentido é o controle de estoque em cadeias de suprimentos, onde sistemas automatizados monitoram e reabastecem produtos automaticamente, com base em algoritmos e previsões de demanda, minimizando erros humanos e otimizando os níveis de estoque.
É importante notar que, embora a IA tenha substituído humanos em algumas tarefas, ela ainda não é capaz de replicar completamente a ampla gama de habilidades cognitivas e emocionais humanas. Muitas vezes, a IA é usada para automatizar tarefas repetitivas e baseadas em dados, liberando os humanos para se concentrarem em tarefas que requerem empatia, criatividade, julgamento ético e tomada de decisões complexas.
Se a Inteligência Artificial afeta mais mulheres, e elas podem perder mais empregos, como isso pode agravar as desigualdades de gênero no mercado de trabalho?
Considerando que a afirmativa do estudo de que a Inteligência Artificial afeta mais mulheres, como atendimento ao cliente e funções administrativas, sem dúvida podemos observar um agravamento de desigualdade, dado que muitos lares no Brasil dependem da renda das mulheres, e neste sentido, é imperativo agir prontamente para capacitar esse grupo em direção a novas oportunidades de carreira.
Felizmente, as mulheres muitas vezes demonstram um notável poder de adaptação, o que pode ser um trunfo nesse novo cenário. Portanto, é essencial investir em programas de formação e capacitação que ajudem as mulheres a adquirirem as habilidades necessárias para prosperar em áreas relacionadas à IA e outras oportunidades emergentes, mitigando assim o impacto das desigualdades de gênero no mercado de trabalho.
Quais ações podem ser feitas para diminuir as desigualdades de gênero no mercado de trabalho?
Pessoalmente, sou grande fã do treinamento e desenvolvimento, pois temos casos de muito sucesso em nossa própria empresa. Mulheres que começaram suas carreiras em áreas técnicas e, com apoio e esforço, conseguiram crescer e se tornar exemplos de eficiência e excelência em suas funções. A partir dessa perspectiva, acredito que o treinamento é fundamental para equipar as mulheres com as ferramentas e habilidades necessárias para competir em igualdade de condições no mercado de trabalho em constante evolução. Além disso, promover a diversidade e a igualdade de oportunidades em todos os níveis da organização, implementar políticas de equidade salarial e flexibilidade no trabalho, bem como sensibilizar para a importância da inclusão, são medidas cruciais para combater as desigualdades de gênero.
Como esse dado afeta mulheres negras?
As mulheres negras podem enfrentar desafios adicionais no mercado de trabalho devido a uma combinação de desigualdades de gênero e raciais. Isso pode torná-las ainda mais afetadas pelas mudanças no cenário de trabalho, incluindo a adoção da Inteligência Artificial. Barreiras econômicas e sociais podem limitar o acesso das mulheres negras a oportunidades de educação e treinamento que são essenciais para se manterem relevantes em um mercado de trabalho em constante evolução, como aquele influenciado pela IA.
Segundo uma pesquisa da Gender Gap Report, ainda são necessários 100 anos para a igualdade de gênero ser alcançada no mercado de trabalho. Como você enxerga isso no seu dia a dia no RH?
Em muitos contextos, o preconceito de gênero ainda é uma realidade que impede o progresso em direção à igualdade.
Ressalto que ainda neste mesmo estudo do Gender Gap 2023, atualmente, as mulheres representam 29,4% das ocupações de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM); E, para funções de liderança de alto nível, como VP e C-suite, a representação em STEM cai para 17,8% e 12,4%, respectivamente.
Portanto, a igualdade de gênero é uma meta que requer esforços contínuos, sensibilização e ação para superar as desigualdades sistêmicas, e estamos comprometidos em continuar avançando nessa direção, garantindo que a igualdade e a diversidade sejam prioridades em nosso ambiente de trabalho.
– Quais são as dificuldades das mulheres para atingir cargos bem remunerados?
Minha perspectiva se concentra mais no tempo necessário para atingir essas posições, independentemente do gênero. Alcançar cargos bem remunerados geralmente requer um comprometimento significativo e muitas horas de trabalho árduo. No entanto, no caso das mulheres, existe o desafio adicional da “jornada tripla” que, muitas vezes, torna o caminho ainda mais árduo. Essa jornada tripla envolve equilibrar responsabilidades domésticas, profissionais e o cuidado com os filhos, o que pode tornar o caminho extremamente exigente e pesado.
No entanto, é crucial reconhecer que essas dificuldades são, em grande parte, devidas a estruturas sociais e expectativas culturais que colocam uma carga desproporcional sobre as mulheres. Neste mesmo estudo do Gender Gap 2023, é importante notar que países nórdicos, como Noruega, Suécia e Islândia, por exemplo, demonstram uma paridade de gênero de aproximadamente 90%. Esses países adotaram políticas de licença parental equitativa, o que garante que homens e mulheres compartilhem igualmente as responsabilidades não remuneradas associadas ao cuidado dos filhos. Essas políticas permitem que as mulheres tenham mais oportunidades para se dedicar ao trabalho remunerado e avançar em suas carreiras, contribuindo para uma maior igualdade de gênero no mercado de trabalho.
Portanto, para superar essas dificuldades, é fundamental que a sociedade e as organizações adotem medidas que promovam a igualdade de gênero, como licença parental equitativa, políticas de flexibilidade no trabalho e a promoção de um ambiente de trabalho inclusivo que valorize e apoie todas as contribuições, independentemente do gênero. Isso ajudará a reduzir as disparidades e permitir que as mulheres alcancem cargos bem remunerados em pé de igualdade com os homens.
Imagem: Drazen Zigic para Freepik