Colunistas
A viagem como negócio: o novo turista brasileiro está moldando o futuro das franquias

Esqueça o acúmulo de bens. Para o consumidor brasileiro, a nova moeda de valor é a experiência. E a mala já está pronta. Essa mudança de mentalidade, longe de ser uma tendência passageira, está redesenhando o mapa do turismo e do varejo no Brasil, e o mercado de franquias entendeu o recado.
Os números não mentem. Uma pesquisa recente da OpinionBox revela que quase 9 em cada 10 brasileiros já estão planejando a próxima viagem de lazer, com um foco massivo em desbravar o próprio país. Esse movimento está criando uma onda de oportunidades bilionárias, e alguns setores do franchising estão surfando nela com maestria.
Não por acaso, os segmentos que mais crescem na economia são justamente aqueles que servem a esse novo viajante. Segundo a Associação Brasileira de Franchising (ABF), no primeiro trimestre de 2024, os destaques foram Saúde, Beleza e Bem-Estar (+14,9%), Hotelaria e Turismo (+14,7%) e Alimentação (+13,7%).
Leia também: Franchising cresce 8,9% no primeiro trimestre do ano
A conexão é direta. Quando o brasileiro pega a estrada, ele busca principalmente três coisas: experimentar a culinária local (71%), descansar de verdade (50%) e cuidar de si. Os setores em alta são a resposta exata para esses desejos.
Ao mesmo tempo, a forma como planejamos e vivemos essa jornada se tornou um quebra-cabeça digital. A inspiração nasce no Instagram (51%) e no Google (62%), mas na hora de comprar a passagem aérea, a confiança fala mais alto e 64% vão direto aos sites das companhias. Já para a hospedagem, o jogo vira: gigantes como Booking.com (55%) e Airbnb (38%) dominam.
É nesse cenário, entre o digital e o desejo por autenticidade, que surgem as melhores oportunidades para marcas que oferecem o que o consumidor mais precisa: confiança e qualidade, em qualquer canto do país.
Quem é o novo viajante brasileiro?
Para aproveitar essa onda, é preciso entender quem está fazendo as malas.
Primeiro, viajar deixou de ser um evento raro. Tornou-se um hábito. Nos últimos 12 meses, 84% da população viajou a lazer pelo menos uma vez. Mais impressionante ainda: para 53% deles, essa escapada acontece, no mínimo, a cada seis meses. A viagem saiu da lista de desejos para entrar de vez no calendário e no orçamento da família.
E o destino preferido é o Brasil. O turismo doméstico reina absoluto, com 67% planejando viagens dentro do próprio estado e 30% para outros estados. O que isso significa na prática? Que a capilaridade geográfica deixou de ser um diferencial para se tornar uma questão de sobrevivência. Negócios que se limitam aos grandes centros perdem uma fatia gigante do mercado. É aqui que o modelo de franquias, com sua capacidade de descentralização, brilha.
O que pesa na hora de escolher o destino?
Entender o “porquê” da viagem é o segredo. O viajante brasileiro é prático, mas movido pela emoção. Os fatores de decisão mostram isso claramente:
- Preço (51%): O bolso ainda comanda a rota.
- Destinos para descansar (50%): A busca por paz e saúde mental tem quase o mesmo peso do dinheiro.
- Conhecer novas culturas (48%): A vontade de viver algo autêntico e diferente.
- Boas opções de hospedagem (44%): Segurança e conforto são essenciais.
É revelador que “destinos da moda” (7%) ou “indicados por influenciadores” (6%) fiquem no fim da lista. Isso mostra um consumidor mais maduro, que pesquisa e se inspira, mas decide com base no que realmente importa para ele, e não em tendências passageiras.
Afinal, o que se faz no destino?
A viagem se concretiza na vivência. E as atividades preferidas mostram uma busca por imersão total:
- Visitar pontos turísticos (77%)
- Experimentar a culinária local (71%)
- Conhecer a história do lugar (55%)
- Fazer compras (46%)
O fato de a gastronomia ser a segunda atividade mais desejada é um insight poderoso. Para o brasileiro, viajar é também uma jornada de sabores. Isso abre um mercado imenso para todo o ecossistema de alimentação, do restaurante sofisticado ao quiosque com sabor local.
Franchising em ação: Onde estão as melhores oportunidades?
Enquanto o consumidor sonha, o franchising transforma esses sonhos em negócios de alto crescimento. A sobreposição dos dados de comportamento com o desempenho dos setores (ABF) mostra um mapa claro das oportunidades.
- Hotelaria e Turismo (+14,7%)
A conexão mais óbvia. Com a desvalorização do real impulsionando o turismo interno e a recente crise de confiança em agências de milhas, o consumidor busca segurança. Franquias de agências com lojas físicas e reputação sólida, como a CVC, ganham força ao oferecer a garantia de que a viagem vai acontecer sem sustos. - Alimentação – Food Services (+13,7%)
Se 71% dos viajantes querem “experimentar a culinária local”, o setor de alimentação se torna parte central da experiência turística. Redes de fast-food consolidadas oferecem a segurança que famílias buscam. Ao mesmo tempo, cafeterias, sorveterias e redes de açaí (como Mais1.Café e Chiquinho Sorvetes) se beneficiam de um público que está de férias, relaxado e disposto a gastar. O franchising leva uma marca de sucesso de uma capital para uma cidade de praia, capturando o turista onde ele estiver. - Saúde, Beleza e Bem-Estar (+14,9%)
A ligação aqui é mais sutil, mas fortíssima. O segundo maior motivo para viajar é “descansar”. Isso se conecta diretamente com a macrotendência de wellness. Abre-se espaço para spas, massagens e terapias. Além disso, há o consumo prático: as pessoas compram cosméticos e perfumes antes de viajar e, durante a estadia, a conveniência de encontrar uma farmácia ou uma loja como O Boticário para um item esquecido é um serviço de grande valor. - Limpeza e Conservação (Crescimento de +16,3%, o campeão do período)
Pode não parecer, mas este setor é um dos motores silenciosos do turismo moderno. Com 38% dos viajantes usando o Airbnb, criou-se uma demanda gigantesca e constante por serviços de limpeza profissional entre um hóspede e outro. Franquias como a Maria Brasileira capitalizam essa necessidade, oferecendo a anfitriões um serviço padronizado e confiável, essencial para manter boas avaliações e o negócio girando. - Serviços Automotivos (+12,6%)
Quase um terço dos viajantes (28%) pega a estrada com o próprio carro. Isso gera duas demandas claras: a revisão antes de partir e a necessidade de suporte durante o percurso. Franquias de serviços automotivos e de aluguel de veículos são beneficiadas diretamente pela força do turismo rodoviário brasileiro.
Conclusão
Não há dúvida: a economia da experiência já é uma realidade, e os setores de Hotelaria, Alimentação, Bem-Estar e Serviços estão no centro dessa revolução. As marcas que entenderem essa conexão profunda, atendendo não só às necessidades práticas, mas aos desejos emocionais do novo viajante, não estarão apenas crescendo. Elas estarão liderando a grande transformação do varejo brasileiro na próxima década.
A viagem já começou. E o franchising não está no banco do carona, mas ao volante.
(*) Patricia Cotti – Ganhadora do Digital Transformation Awards, Sócia Diretora da Goakira, Diretora de Pesquisa do IBEVAR, Colunista Central do Varejo, Professora dos MBAs da FIA, ESPM, ESECOM, USP.
Fontes: Pesquisa Turismo e Viagens (OpinionBox); Relatório Desempenho do Franchising 1TRIM25 (ABF); Relatório Desempenho do Franchising 2024 (ABF)
Imagem: Envato