Demitir clientes?

Escrito há quase 30 anos na Harvard Business Review, Michael Porter aborda o conceito de Estratégia. A fascinante arte de fazer escolhas perante as encruzilhadas pelas quais os gestores se deparam no mundo empresarial. O chamado Trade-Off força posicionamentos que alinhados à cultura e principalmente ao objetivo de longo prazo a empresa é colocada à prova para não cair em tentações. Muitas das quedas empresariais derivam do sucesso passado, por incrível que pareça. Portanto, o tal posicionamento inclui obrigatoriamente a busca incessante pela inovação, crescimento com margens, mas principalmente com desapego. Mais do que escolher o que fazer, estratégia significa o que NÃO fazer. É essa escolha da segmentação de mercados, divididos em nichos, geografias, propensão a preços, conveniência e tantos outros atributos que visam entregar valores exclusivos percebidos pelos clientes.

E nesse processo cíclico de observação constante dos movimentos concorrenciais, tecnológicos e sociais, uma verdadeira encruzilhada se coloca diante de ofertar um portfólio de produtos e serviços aderente ao futuro, (e melhor para quem o cria e sai na frente). Permanecer com amarras a determinados itens com histórico decrescente, menores margens que os atuais, complexidade de fabricação (no caso de produtos) ou de suporte (serviços), e desalinhamento apenas cria uma postergação de decisão necessária.

Criar escassez pode resultar numa bela saída, com produtos “revival”, ou versões temporárias exclusivas. Aqueles amados sabores, tamanhos, cores ou funcionalidades podem entrar e sair de linha com uma velocidade espantosa de críticas e elogios, ainda mais em época de redes sociais onde o julgamento é instantâneo.

Sabe aquele ítem que apenas os clientes “X” compram, é sabido que a chance de o perder é grande, mas a complexidade da retirada do portfolio traz mais benefícios que compensa a dor de cabeça? Fazer do limão uma limonada, estratégias de estocagem, aviso prévio, divulgação com toque humanizado, tudo ajuda. Mas também é necessário que às vezes, se demita um cliente em nome do futuro!

Um exemplo recente com a “volta”, mesmo que temporária, do McFish, que foi tirado de linha pelo McDonald’s, trouxe a possibilidade de resgate por milhares de clientes. Foi preciso entender que mais até do que o prazo de validade, estocagem, manipulação e por ter menor venda em relação aos demais “SKUs”, o posicionamento da rede em atender de forma “fast”, atrapalhava o padrão de entrega. Foi uma febre, estourou todas as expectativas, e criou ainda mais dúvidas na gestão sobre se valeria a pena, mesmo que se aumentassem os preços (lei de oferta e procura sempre prevalece), retomar sua continuidade, tal qual ainda vigora em outros países.

A coragem para se excluir o Marzipan, produto que deu origem à Kopenhagen que não possui chocolate na sua formulação, ou ainda a decisão de a Volvo apenas fabricar veículos híbridos, quando a empresa foca em segurança, mesmo que ambiental, são exemplos de firmeza quanto à demissão de alguns clientes, em nome dos demais.

Imagem: Envato

*Carlos Sgarlata é casado com a Ana Paula e pai de 2 tesouros, amante da Itália e de esportes. Foi Campeão Brasileiro de Kart. Formado em Administração pela PUC-SP, possui MBA em Gestão pela FDC-MG e Master Conselheiro em Governança e Nova Economia pela Go.New. Membro da AV Varejo, painelista, palestrante e entusiasta de finanças e estratégias em desenhos de canais de distribuição. Acumula mais de 20 anos de experiência em indústrias de bens de consumo e varejo, com início em empresa BIG 4 PwC, e atuações como Embaixador do Capitalismo Consciente em seus projetos de consultoria de Turn Around, Valuation e M&A. Atua no ecossistema de Franchising, holdings familiares, foi Professor de Estratégia, Franchising e Empreendedorismo, além de membro de Conselhos Consultivos e de Administração. Multifranqueado Kopenhagen há 12 anos, dos quais metade deles como membro de Comitês Financeiros, e membro do Conselho de Franqueados na gestão Advent e Nestlè. Acompanhe o autor no LinkedIn, no ABC do Franchising e nas redes sociais: @carlos_sgarlata.